Despudores (3)


Continuando a apregoar disparates em portas de igrejas e locais de decoro...


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Quando eu era mais novo, vestindo espinhas e bigodinho de cobrador, eu me encucava com uma coisa: passava por umas garotas bonitas e elas davam uma ajeitadinha na blusa, uma puxadinha assim, de leve, como se quisessem esconder a barriga, um sinal, um pneuzinho, qualquer coisa aí que elas pudessem achar imperfeito. Ou uma ajeitada no cabelo, essa também é clássica. E eu achava que de repente ela não gostou de mim, não gostou que eu olhasse, não agradei e tava se poupando de uma presença sensorial minha. Com o tempo fui entendendo (homem demora a entender qualquer coisa) que era exatamente o contrário. Mulher tem uma paranóia, que varia de nível, quanto a própria aparência. Por mais linda, ela acha defeito onde não tem. Pelo menos todas tem dois quilos pra ganhar ou perder, segundo própria concepção. Aquela que tem a pele branca e macia sonha em ser mulata. Aquela que é morena e quente sonha em ter cabelo liso. E coisa vai coisa vem.

E então passei a valorizar esses pequenos sinais da timidez, que também são sinais de que gostaram um pouco de ser olhadas. Porque não olho pra mulher com cara de babão ou taradão da esquina (mentira, as vezes olho), é mais olho no olho mesmo, os outros detalhes ficam pro treino da visão periférica. Sem o desrespeito vulgar transparece o elogio. E, jovem, eu era até bonitinho, sempre tinha alguma gostando de alguma coisa, que mulher também é boba pra isso. Hoje, to ainda no meio do caminho pra bagaceira, se me aprumar dou até um caldo, dizem as gastronômicas, mas um caldo ralo, vá lá.

E, bulindo com esse meu primeiro engano adolescente, gosto até hoje de reparar nesses gestos, no ajeitar do cabelo atrás da orelha, na arrumadela relâmpago e discreta na roupa, num desviar do olhar pra logo depois voltar, naquela menina que caminha ao lado da mãe e, com pudor de ser pega em flagrante num flertezinho inocente, sagazmente atrasa um pouco o passo, muito pouco, pra poder mirar com mais liberdade. Algumas são mais ousadas e encaram mesmo, tão nem aí com a paçoca; e, então, quem perde a linha sou eu. Adoro.

Espero mesmo que o tempo seja gentil comigo. Ou vou sentir falta disso.

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Já realizei a maioria das minhas fantasias sexuais. Aí uma delas se tornou realizar tudo de novo. Mas há duas que são impossíveis, infelizmente. Não falo daquela de promover uma orgia no metrô de Tóquio (adoro as japas) nem de fazer um mochilão erótico pelo norte europeu (adoro as ruivas), ou ainda de fazer de Oslo a capital do Japão (e juntar nessa balaiada a impossibilidade genética de fazer das japas ruivas e das ruivas japas). Não é isso ou aquilo. Nem chega perto. São outras, ainda mais adentro do reino da ficção científica.

Uma delas é a de ter um retrovisor acoplado no ombros. É que eu sou fascinado, muito fascinado, no rebolado de uma mulher. E nem sempre a etiqueta prega que pega bem ficar torcendo o pescoço, por mais pura que seja essa admiração. Por isso sempre sento nas cadeiras viradas pra rua, nos bares da vida, que é pra ter a visão privilegiada. Mas aí vem ela, uma morena (todas são morenas nessas horas), caminhando com aquela graça que deus lhe deu, e é no andar, no agitar das cadeiras, que mais marca e denuncia todo o conjunto da obra, toda a perfeita proporção, coisa de deixar caracol chupando o drops da inveja nos seus cálculos pra construir carapaça. Ela vem e a rua se torna a rua da luz mais bonita do mundo. Você fica com cara de bobo admirando aquele movimento, e como os cabelos acompanham o mexe-mexe do quadril, e como os braços se movem denunciando a natureza, como o olhar continua fixo mesmo no terremoto. É de dar larica nos outros sentidos. E então ela passa por você e o retrovisor se faz urgente, conseguem me entender? Que não é porque ela passou que o espetáculo deixou de acontecer, fica até mais bonito, show must go on, cantarolava mestre Mercury, o Fred.

A outra fantasia é ainda mais insana, quase coisa de ciborgue: ter um chuveirinho acoplado no corpo. Sabem aquele chuveirinho, aquela ducha? Claro que sabem. Aquela que faz as donzelas saírem mais sorridentes do banho, com um rubor no rosto: quente, intensa, massageante, etcéteras, vocês sabem sim. Pois aprendi a fazer direito umas duas ou três coisas na vida e ter um troço desse em mim seria só mais lucro, imaginem aí o que quiserem. Se um dia a ciência permitir um delírio desses e lançar no mercado, sou o primeiro na fila do Ricardo Eletro, pode crer.

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- Quer dizer então que o senhor convenceu 18 mulheres a serem fotografadas mantendo relações sexuais entre si, EM PRAÇA PÚBLICA, e alega que isso é arte?

- A pergunta, meritíssimo, é que se o senhor não concordar que isso era uma oportunidade irrecusável pra mim, o que sua mulher vai pensar do senhor?

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Esse abismo entre o feminino e o masculino, esse território inóspito, esse faroeste na Itália. Não se restringe, nem de longe, ao fato de um lado usar polainas e o outro anáguas. Vejamos apenas os votos.

Na saúde e na doença é um dos motes. Na saúde elas estão bem, na doença elas agüentam, sentem cansaço, incômodo, querem mais mimos. Nós homens, sofremos. Vem uma gripe e já redigimos todo o testamento mentalmente. Pode ser nosso último dia. Podem ser nossas últimas palavras. Duvidamos que sairemos ilesos daquilo, sem seqüelas. A vida nunca mais será a mesma. Três dias depois, sintomas aliviados, assunto esquecido.

Na riqueza e na pobreza é o oposto. A gente fica mais na boa, corrói um pouco por dentro, mas é isso, entendemos como uma fase entregue às dívidas, às preocupações, ao crediário, a vida é páreo duro. A mulher fica a beira do surto. Não falo de interesseiras, rameiras, pistoleiras e outras eiras sem beiras. A mulher comum mesmo. Independente ou dependente, companheira ou avulsa, havendo ou não empoleiramento dos pombinhos. Tenho uma teoria sobre isso, até um tanto crível (donde crível é o que se crê, nada mais), mas essa vou guardar pra mim, pra evitar bate bola ou ter a palavra machismo talhada no peito com ponta de faca em brasa, que os tempos são de independência ou morte, não necessariamente nessa ordem.

No porre e na sobriedade é dos assuntos um pouco menos explorados, mas Ben Jor cantou aí sobre a Bebete. A mulherada, quando entorna cachaça, se alivia, se solta, se diverte, é coisa bonita de se ver, até pelo perigo – e há, hermano, saiba que há. A gente ultrapassa esse nível pra cair naquele limbo chamado bebaço. Eu mesmo, por exemplo, bebo pouco, mas esse pouco me transforma nunca cara que bebe muito. Puxamos o companheiro pela lapela pra falar cara a cara, cuspindo perdigotos. Queremos dizer “umas verdades aí”, pra parente, pras mulheres, pro garçom, pro que for. Não sei se já é crime, se não será em breve, bebum andar portando megafone.

Talvez um dos poucos consensos seja o fato de que é absurdo uma mulher deixar crescer o cabelo do suvaco ou um cara viver mijando fora do vaso.

Façam aí uma breve apuração entre vossos convivas e pimba, vão ver que to certo.

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Mulher ressentida, arma na mão, homem suplicante:

- Por favor, não faça isso, prometo te tirar dessa vida!

- Eu também.

Sobe o cheiro de pólvora, descem as cortinas, ninguém aplaude.

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Ela é solteira e adora isso. Assina como solteira. Se vê como solteira. Quando sofre, o chocolate resolve e a crise de consciência passa. Solteira além de tudo. Deixa inveja nas amigas.

Mas, no dia em que pegou o buquê da noiva, logo depois de um casamento – e foi madrinha, com honra e orgulho – toda a certeza foi por água abaixo. Muito além do chocolate.

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Declaração de uma balzaca dama da noite:

“Antigamente era bom ter cliente velho. A maioria já tá broxa, então queriam mesmo era um carinho, uma conversa, uma companhia. Alguns pagavam a mais, outros choravam pra pagar, mas pagavam, sempre. Agora, com esses comprimidinhos azuis de paraísos artificiais pra eles e infernos carnais pra nós, aquela paudurescência inverossímil (sim, ela diz inverossímil e outras tantas expressões lindas, só ignorante não apaixona), e toma na frente, e toma atrás, e toma em cima, e toma embaixo, ficou foda, animalizou geral”.

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Já falei antes de metrossexualismo, nem vou insistir no ponto. As leis de agora não me dão muita folga nem largura de palavras. Algumas mulheres até, pasmem, acham bonitinho. Quero ver as moças manterem essa opinião quando não acharem mais horário que preste nas clínicas de depilação.

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Celebridade vai, celebridade vem, Angelina Jolie e Natalie Portman continuam sendo as musas de meus crimes de Onã.

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- Olha a cobra!
- É mentira!
E as duas garotas curtiam a festa junina na cama.





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Creditos:
Texto e fotografia: Thiago Carvalho (todos os direitos reservados)
Publicado no blog O Inimigo do Bom é o Melhor

comment 1 comentários:

Krisnatágoras on 09:28 disse...

Crimes de Onã... super curti!

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